Alimentação Zen/Chan

Oryoki: a tigela que contém o suficiente

A palavra oryoki se refere ao conjunto de tigelas que são usadas nas refeições formais da tradição Zen e à prática meditativa e cerimonial de comer. “O” significa a resposta do receptor à oferta de comida, “Ryo” significa uma medida ou uma quantidade a ser recebida, e “Ki” significa a tigela. Frequentemente a palavra japonesa é traduzida como “a tigela que contém a quantidade apropriada.” O termo oryoki é usado principalmente na escola Soto Zen ou Soto Shu. Nas escolas Rinzai e Obaku é utilizado o termo jihatsu.

O conjunto oryoki geralmente é composto por:

  • 3 ou mais tigelas. A tigela maior é chamada de Tigela de Buda ou zuhatsu, e simboliza a cabeça do Buda e a sua sabedoria. As outras tigelas são progressivamente menores.
  • 2 pauzinhos (hashi)
  • Colher de madeira
  • Espátula
  • Guardanapo de pano
  • Pano de limpeza
  • Pano para embrulhar o conjunto

A prática meditativa e cerimonial do oryoki é um ritual altamente coreografado de servir e comer comida, uma “dança” cerimonial de dar, receber e agradecer. É provavelmente o cerimonial mais elaborado no Zen. Oryoki unifica a vida diária e a “prática espiritual”.

A refeição formal é feita geralmente no Zendo (sala de meditação) utilizando a postura de meditação. Uma série de gestos e cantos de dedicação e apreço são feitos, mas no momento de comer é observado o silêncio. A ecologia do oryoki é completa: não há desperdício. Os participantes são incentivados a comer apenas a quantidade certa de comida – nem uma migalha deve permanecer. O líquido de limpeza, depois de utilizado na lavagem de cada tigela, é bebido parcialmente e o restante recolhido e distribuído no jardim. Cada movimento do oryoki é compacto, sutil e projetado para se desdobrar em harmonia, exigindo consciência meticulosa do que está acontecendo no momento.

Para iniciantes, entrar nessa dança pode ser assustador. A prática do oryoki, sutil e firmemente expõe os padrões e pontos críticos das nossas mentes e dos nossos comportamentos. O professor do Dharma Zoketsu Norman Fischer diz que: “A intensidade da prática do oryoki é tal que você consegue ver as suas próprias tendências em relação a comer e servir uma refeição. Alguém que come pode pedir comida demais, e um servidor pode dar de menos – surgem a ganância e a mesquinhez. A prática oryoki desenvolve bondade e clareza e o senso de não exagerar ou subestimar nada. Ensina suavidade e eficiência e o sentido de agir com bom coração.” Depois que a falta de jeito inicial passa, o oryoki pode se tornar uma parte maravilhosamente vital da prática zen budista.

Devemos nos lembrar também que quando comemos, tiramos vidas. John Daido Loori Roshi escreve no seu livro Celebrating Everyday Life que “oryoki não é apenas uma forma prescrita de ritual. É um estado de espírito. Não se trata de cânticos, reverências e sinos. É um estado de consciência. Porque o alimento é vida, é de extrema importância que o recebamos com a mais profunda gratidão. Quando comemos, consumimos vida. Quer seja repolho ou vacas, é a vida.”

As raízes do oryoki remontam à época do Buda e dos monges mendicantes errantes que possuíam pouco mais do que as suas vestes e a tigela de esmolas. Mas a prática atual foi codificada na China durante a dinastia T’ang, tendo evoluído em mosteiros budistas na China e no Japão ao longo de muitos anos. Esta cerimónia também serviu de modelo para a graciosa e arrebatadora cerimónia do chá.

Atualmente tanto monges quanto leigos fazem a prática do oryoki em mosteiros Zen e locais de prática, principalmente durante retiros. Chögyam Trungpa Rinpoche, o professor do budismo tibetano que fundou a escola Shambhala, também adotou esta prática.

A tradição budista afirma que, depois que Huineng recebeu o manto e a tigela de monge como evidência de ter recebido a transmissão do Dharma, a tigela em si foi considerada um símbolo de transmissão do professor para o aluno.

.: Gokan No Ge (Verso das Cinco Contemplações) :.

Nos retiros da Soto Zen (sesshin), a seguinte prece é recitada antes das refeições formais (pequeno-almoço e almoço, o jantar é uma refeição informal no qual não há cerimonial).

“Recebamos esse alimento conscientes dos inumeráveis esforços necessários para que ele chegue até nós;
Examinemos a nossa prática para verificar se ela é digna dele;
Recebamos esse alimento como um remédio que nos permite continuar a praticar;
Recebamos esse alimento livre de toda avidez;
Comemos para praticar o bem, para evitar o mal, para seguir o caminho de Buda.”

Referências: Wikipédia, Tricycle 1, 2.

Saiba mais (link externo – eng):

  • Oryoki (Site oficial Soto Zen)

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2 comments

  1. Realmente tiramos vidas quando comemos, no entanto entre mastigar uma couve ou torcer o pescoço de uma galinha, prefiro a primeira opção, principalmente porque colocar-me no lugar da galinha que adora viver também, me impede de machucá-la, tendo em vista que nenhum ser humano é tão importante assim que valha o sacrifício de uma vida apenas para alimentá-lo. Plantas, embora vivas, são isentas do sistema nervoso central, NÃO SENTEM DOR e, desse modo, ao ser cortadas e cozidas não sofrem, é óbvio, ao contrário dos seres vivos que, quando mortos, deixam impregnada na própria carne, a energia nefasta do medo, da angústia e do desespero diante da morte. Ingerir esse alimento não parece saudável, nem para nós nem para eles.

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