Sugestão de livro: O Cérebro de Buda: Neurociência Prática Para a Felicidade; Autores: Richard Mendius, Rick Hanson; Editora: Alaúde.
Sinopse
Com explicações claras acerca da estrutura e do funcionamento do cérebro, os autores de O cérebro de Buda demonstram que é possível condicionar a mente para obter mais felicidade e sabedoria no dia a dia através de práticas meditativas simples e rápidas.
Sempre fundamentado em estudos científicos, o livro mostra como modificar e treinar o fluxo de pensamentos para ativar respostas positivas, com calma e compaixão, em vez de reações negativas, cheias de raiva e angústia.
Indicado a quem busca bem-estar e paz de espírito, O cérebro de Buda é leitura essencial para compreender melhor o cérebro, mudar a mente e transformar a vida.
Trecho
«Os eventos ruins em geral têm impacto maior do que os bons. É muito fácil adquirir o sentimento de impotência por causa de alguns fracassos, mas livrar-se dele é outra história, mesmo tendo muitas experiências bem-sucedidas depois (Seligman 2006). As pessoas se esforçam mais para evitar uma perda do que para obter um ganho equivalente (Baumeister et al. 2001). Em comparação com ganhadores da loteria, vítimas de acidentes costumam demorar mais tempo para voltar ao estado original de felicidade (Brickman, Coates e Janoff-Bulman 1978). O que se diz de ruim sobre uma pessoa tem mais peso do que o que se diz de bom a respeito dela (Peeters e Czapinski 1990), e, nos relacionamentos, são necessárias cerca de cinco interações positivas para compensar os efeitos de uma única negativa (Gottman 1995).
Marcar Permanentes
Mesmo que você tenha esquecido uma má experiência, ela deixa uma marca indelével em seu cérebro (Quirk, Repa e LeDoux 1995). Esse resquício permanece ali, latente, pronto para ser reativado caso você depare com uma situação amedrontadora semelhante.
Círculos Viciosos
As experiências ruins criam círculos viciosos, tornando a pessoa pessimista, reativa e inclinada a se ver de maneira negativa.
Evitar nos faz sofrer
Como se pode ver, o cérebro já vem com uma “propensão ao negativismo” integrada (Vaish, Grossman e Woodward 2008) que o prepara para o escape. Essa propensão gera inúmeras formas de sofrimento. Em primeiro lugar, provoca uma desagradável sensação de ansiedade, que, para algumas pessoas, pode ser bem intensa. A ansiedade também torna mais difícil interiorizar a atenção para o autoconhecimento ou a prática contemplativa, uma vez que o cérebro se mantém em processo de análise para garantir que não haja nenhum problema. As tendências negativas alimentam ou intensificam outras emoções desagradáveis, como raiva, tristeza, depressão, culpa e vergonha. Enfatizam falhas e perdas passadas, subestimam habilidades atuais e exacerbam futuros obstáculos. Assim, a mente tende a fazer julgamentos injustos a respeito do caráter, da conduta ou das capacidades de uma pessoa. A carga de julgamentos desse tipo pode deixá-lo esgotado.
No Simulador
No budismo, o sofrimento é considerado o resultado do anseio expresso por meio dos Três Venenos: ganância, ódio e ilusão. São tão fortes que abrangem uma gama de pensamentos, palavras e proezas, mesmo os mais fugazes e sutis. A ganância é uma necessidade extrema de agarrar as oportunidades; o ódio, a aversão a obstáculos – ambos envolvem o desejo compulsivo por mais prazer e menos sofrimento. A ilusão é um apego à ignorância a respeito de como as coisas são de fato – um exemplo disso é não enxergar o fato de que elas são interligadas e mutáveis.
Realidade virtual
Às vezes, esses venenos são evidentes, mas, na maior parte do tempo, ocorrem em segundo plano, sem percebermos, disparando e se comunicando silenciosamente. Eles fazem isso usando a extraordinária capacidade do cérebro de representar tanto a vivência interior como o mundo lá fora. Por exemplo, os pontos cegos à esquerda e à direita no campo visual não têm forma de buraco no mundo exterior; na verdade, o cérebro os preenche, assim como um programa de edição de imagens corrige a vermelhidão nos olhos de pessoas que olharam para o flash . O fato é que muito do que você vê “lá fora” é criado pelo cérebro, como os efeitos de computação gráfica em um filme. Apenas uma pequena fração do que entra pelo lobo occipital vem diretamente do mundo exterior; o resto vem do suprimento interno de memória e dos módulos perceptivos de processamento (Raichle 2006). O cérebro simula o mundo – cada um de nós vive uma realidade virtual próxima o suficiente da realidade para não nos chocarmos com o que estiver pela frente.
Dentro desse simulador – cujo substrato neural parece estar situado na parte superior central do córtex pré-frontal (Gusnard et al. 2001) –, filminhos vão passando sem parar. Estes são os elementos básicos de grande parte da atividade mental consciente (Niedenthal 2007; Pitcher et al. 2008). Para nossos antepassados, simulações contínuas de acontecimentos passados possibilitavam sua sobrevivência, pois fortaleciam o aprendizado de comportamentos bem-sucedidos pela repetição de seus padrões de disparo neural. Simular eventos futuros também favorecia a sobrevivência de nossos ancestrais, dando-lhes capacidade para comparar possíveis resultados – a fim de decidir pela melhor abordagem – e para preparar de antemão sequências sensório-motoras potenciais para ação imediata. Ao longo dos últimos 3 milhões de anos, o cérebro triplicou de tamanho; muito dessa expansão aprimorou as aptidões do simulador, gerando mais benefícios para a sobrevivência.
Simulações causam sofrimento
O cérebro ainda cria simulações hoje em dia, mesmo quando elas não têm nada a ver com a questão da sobrevivência. Tente observarse quando sonhar acordado ou repassar na cabeça um problema de relacionamento: você verá os filminhos passando, pequenos pacotes de experiências simuladas, em geral com apenas alguns segundos de duração. Se avaliar bem a situação, descobrirá várias coisinhas erradas:
- Por sua própria natureza, o simulador tira a pessoa do momento presente. Ali está alguém, assistindo a uma apresentação no trabalho, executando um serviço ou meditando, e, de repente, a mente está a milhares de quilômetros de distância, presa em um encontramos a verdadeira felicidade, amor ou sabedoria.
- No simulador, as coisas boas parecem extraordinárias, esteja você pensando em repetir um pedaço de bolo ou imaginando a reação que um relatório no trabalho causará. Mas o que você realmente sente quando interpreta o filminho na vida real? É tão legal quanto parecia ser na sua mente? Normalmente não é. Na verdade, as recompensas do cotidiano não são tão intensas quanto as que criamos no simulador.
- Os filminhos no simulador são cheios de crenças: É claro que ele vai dizer isso se eu falar aquilo… É óbvio que vão me passar para trás. Às vezes, essas coisas são verbalizadas claramente, mas, na maior parte do tempo, são implícitas, integradas ao enredo da história. Então, as crenças explícitas e implícitas em suas simulações são verdadeiras ? Pode ser que sim, mas geralmente não. Os filminhos nos deixam paralisados por sua visão simplista do passado e por definirem reais possibilidades para o futuro, como novas maneiras de se aproximar das pessoas ou sonhar alto. Crenças são as grades de uma cela invisível, que o prendem a uma vida que é menor do que a que se poderia ter verdadeiramente. A sensação é semelhante à de um animal do zoológico que é liberado em um grande parque, mas ainda está confinado nos limites de sua velha gaiola.
- No simulador, eventos perturbadores do passado são revividos o tempo todo, o que, infelizmente, torna mais fortes as associações neurais entre um fato e os sentimentos dolorosos que ele suscita. O simulador também prevê situações ameaçadoras no futuro. Mas, no fim, a maioria desses acontecimentos inquietantes nunca se materializa. E, entre os que realmente ocorrem, muitas vezes a aflição experimentada é mais leve e breve do que se esperava. Imagine-se declarando seus sentimentos a alguém: isso pode desencadear um filminho que termina em rejeição e decepção. Contudo, quando nos abrimos com uma pessoa, não é verdade que acabamos nos sentindo muito melhor?
Resumindo, o simulador nos tira do momento presente e nos leva a desejar coisas que nem são agradáveis assim, enquanto ignoramos recompensas mais significativas, como satisfação e paz interior. Esses filminhos mentais que criamos são cheios de convicções limitantes. Além de reforçarem emoções dolorosas, fazem com que nos desviemos de obstáculos que muitas vezes nem encontraremos no caminho ou que não são tão ruins como imaginamos. E o simulador faz isso o tempo todo, dia após dia, até mesmo nos sonhos – construindo gradualmente a estrutura neural, boa parte da qual contribui para o sofrimento.
Autocompaixão
Todo mundo tem seus momentos de sofrimento, e muitas pessoas sofrem bastante. A compaixão é uma reação natural ao sofrimento, inclusive o próprio. Autocompaixão não é autopiedade, mas ternura, interesse e desejo de melhora – assim como a compaixão por outra pessoa. Por ter uma carga emocional maior do que a autoestima, tem mais poder de reduzir o impacto de situações difíceis, preservando o amor-próprio e construindo resiliência (Leary et al. 2007). Esse sentimento também é libertador; afinal, quando alguém se fecha no próprio sofrimento, é difícil ser receptivo ao sofrimento alheio.
“A base da compaixão é a compaixão por si mesmo.”
– Pema Chödrön
Além do sofrimento da vida cotidiana, o caminho do despertar tem experiências difíceis que também pedem compaixão. Para ser mais feliz, sábio e amoroso, às vezes é necessário lutar contra tendências antigas no próprio sistema nervoso. Por exemplo, sob alguns pontos de vista, os três pilares da prática não são naturais: a virtude preserva reações emocionais que funcionaram bem nas planícies africanas do Serengueti, a atenção plena reduz a vigilância exterior, e a sabedoria transpõe crenças que uma vez já foram úteis para nossa sobrevivência. Isso vai contra o padrão evolucionário para anular as causas do sofrimento, sentir-se uno com todas as coisas, seguir o fluxo do momento em transformação e manter-se tranquilo diante tanto do bom como do ruim. que estamos lutando e ter alguma compaixão por nós mesmos.
Para estimular a autocompaixão e fortalecer os circuitos neurais:
- lembre-se de como é estar com alguém que realmente gosta de você sensação de receber carinho ativa o sistema responsável pelo afeto no cérebro, munindo-o de compaixão;
- pense em alguém por quem você naturalmente sinta compaixão, como uma criança ou pessoa por quem tenha afeto – esse fluxo tranquilo de compaixão desperta suas bases neurais (entre elas a oxitocina, a ínsula [que percebe o estado interno do corpo] e o córtex pré-frontal), preparando-as para a autocompaixão;
- estenda essa mesma compaixão a você – esteja consciente do seu sofrimento e direcione a si mesmo a atenção e o desejo de melhora; sinta a compaixão infiltrar-se em lugares nunca antes acessados em seu íntimo, como uma chuva suave que tudo toca. As atitudes relacionadas a um sentimento o fortalecem (Niedenthal 2007); então, pouse a palma da mão na face ou no coração com a ternura e o carinho que você daria a uma criança carente. Interiormente, diga frases como Que eu seja feliz novamente , Que a dor deste momento desapareça; em especial, abra-se à sensação de que está recebendo compaixão –no cérebro, lá no fundo, a verdadeira fonte dos bons sentimentos não tem muita importância; independentemente de a compaixão vir de você ou de outra pessoa, deixe-se envolver pela sensação de estar sendo confortado e cuidado.»
Veja também:
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- Conhecendo a sua mente natural | Mingyur Rinpoche
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- O Buda e o Cientista | S. N. Goenka
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