Artes Zen/Chan

Omotenashi: a hospitalidade na Cerimónia do Chá e no quotidiano

A palavra japonesa omotenashi geralmente é traduzida como hospitalidade, mas é mais do que isso. É o desejo altruísta de cuidar dos outros, é tratar os outros como gostaria de ser tratado, é tratar o outro bem, é colocarmo-nos no lugar do outro e compreende-lo, é ver a positividade no outro, e também é superar expectativas e antecipar as necessidades da outra pessoa. É um sentimento que envolve humildade, honestidade, amizade, compaixão, empatia, gentileza e educação.

Omotenashi desempenha um papel importante na cultura japonesa e é especialmente percetível nos negócios, principalmente no atendimento aos clientes. Porém, não deve ser confundido com “serviço”, é que o serviço geralmente é feito com a esperança de que os clientes paguem por um produto, enquanto que o omotenashi é realizado sem a expectativa de nada em troca, sem segundas intenções. Quando há omotenashi também não existe distinção entre o anfitrião e o hóspede, ou o empregado e o cliente, ambos são tratados de igual para igual, com respeito mútuo. Mas infelizmente, alguns seguem esta filosofia mais por disciplina e obrigação, porém, quando não vem do coração não é verdadeiro omotenashi.

O omotenashi abrange várias áreas da vida e também acontece quando por exemplo se utiliza uma máscara para evitar infetar os outros, quando se vai ao cinema e se deixa o lugar limpo e sem embalagens de pipocas ou outras coisas que se tenha consumido, quando os adeptos limpam a bancada do estádio onde assistiram a um jogo(ver notícia), quando se é pontual, quando se dá o lugar a alguém numa fila ou transporte público, é a existência de acessibilidades aos deficientes, etc.

Na cerimónia do chá japonesa (Chadô) o conceito de omotenashi desempenha um papel central. O conceito terá sido estabelecido por Sen no Rikyu, por meio das suas formas de entreter os seus convidados.

A ideia não é apenas tomar um chá, mas sim ter um momento especial com os convidados. O anfitrião faz o chá meticulosamente na frente dos convidados e, todos os aspetos da preparação são belamente apresentados.

Os convidados são muito importantes para o anfitrião, e é por isso que se dá tanta atenção aos detalhes. Os doces, as flores, os utensílios e até mesmo o jardim do lado de fora da casa de chá e a própria arquitetura da casa ajudam a definir o clima.

E além de todos esses aparatos, até mesmo ao tempo se atribui um papel importante. No 2º episódio do programa “O Chefe e a Cidade” (Culinary Journeys) que passou na CNN Portugal no dia 4 de Dezembro deste mês, o mestre de chá Soko Udagawa, afirmou que “nós pensamos não só no espaço, mas também na forma como o tempo passa à medida que a entrada e o jardim são percorridos. O tempo vai passando e é a relação que o mesmo cria com o espaço que acaba por definir toda a experiência. O que interessa não são as peças que temos expostas, mas sim a relação existente entre o tempo e o espaço.” O próprio percorrer do corredor representa uma mudança de estado de espírito que permite a preparação para a cerimónia.

Mas mesmo que a cerimónia seja conduzida impecavelmente, é inútil se não é feita de coração puro. Sen no Rikyu escreveu um poema que diz o seguinte: “Embora você limpe as mãos e limpe a poeira e a sujeira dos recipientes, de que adianta todo esse rebuliço se o coração ainda está impuro?” Ao praticar a cerimónia do chá, fica-se ciente da beleza do momento presente. Tanto o anfitrião quanto os convidados podem abrir seus corações em total paz, bem como compartilhar uma tigela de chá. Cada experiência é “ichigo ichie”, uma experiência única na vida. Assim, diz-se que tanto o anfitrião como o hóspede devem agir com sinceridade. “Porque a vida é cheia de incertezas, é preciso gravar no coração os acontecimentos do dia como se não houvesse amanhã. A cerimônia do chá de hoje é uma experiência única na vida, e o anfitrião, juntamente com os seus convidados, devem abordar o encontro com total sinceridade”, afirmou Sen no Rikyu.

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