Essa é uma pergunta que precisa ser qualificada. O que se quer dizer com ter um professor? Significa se submeter a alguém, praticando estrita e obedientemente o que ele/ela ensinam? Significa visitar ocasionalmente para receber ensinamentos? É possível ter vários professores? Devem ser da mesma escola ou podem ser de escolas diferentes? – Ricardo Sasaki
Qual a importância de se ter um mestre espiritual?
Monja Coen responde
Transcrição:
Eu tenho evitando muito essa palavra mestre, porque dá a impressão que a gente pega um ser humano e o coloca num pedestal, e ele é especial, tão especial, tão separado de mim, que eu só fico lá beijado os seus pés.
A ideia é como é que eu encontro alguém que é esse bom amigo, essa boa amiga, que é meio parecido comigo, que sabe alguma coisa mais do que eu, e que pode me apontar o caminho.
Assim como… se eu vou entrar numa mata ou subir uma montanha que eu nunca fui, eu posso contratar um guia. E eu tenho que confiar nesse guia, porque esse guia já passou por essa montanha ou por esse caminho antes de mim, e ele vai dizer, porque ele sabe o que tem mais ou menos nesse caminho, embora a gente saiba que na natureza tudo esta-se transformando e pode estar diferente, mas ele tem certas noções.
O mestres espiritual ou guia espiritual é alguém dessa maneira. Eu vou subir esta montanha, esta montanha que nunca subi, e que ela pode me enganar. Eu posso ter uma bússola, eu tenho uma mapa que seriam os sutras, eu tenho os ensinamentos, eu tenho os textos sagrados, eu tenho a ritualidade que me ajuda nesta caminha.
Mas eu posso me desviar, eu posso ir por uma rota que me leva para baixo da montanha em vez de para cima, embora ela tenha uma pequena elevação.
E este guia espiritual, esta pessoa que já veio aqui antes vai dizer: “olha por ai talvez não seja o caminho”. Mas pode ser que ela também não conheça ou ele não conheça uma cratera que surgiu nessa caminhada desde a última vez que essa pessoa passou por ai.
Por isso é preciso mesmo com um guia ou com uma guia de que todos andem juntos cuidadosamente. Não é porque apenas eu tenho um guia ou que o guia falou, que eu vou fazer o que falou. Não, não, eu vou olhar com cuidado, porque o meu passo não é o passo do guia, o meu corpo não é o corpo dessa pessoa, as experiências de vida minhas são minhas. E eu posso agregar esse conhecimento para que me levem numa rota, mas eu não posso fechar meus olhos, e apenas seguir esta pessoa que também pode estar com os olhos um pouco vendados.
Não é porque é um guia que significa que sabe tudo e tem tudo. É um ser humano, que também pode ter suas falhas e seus erros, mas que já passou por esse caminho. E como é que eu aprecio esta experiência? É como na escola, um professor… um professor de alguma arte, você apenas pode aprender a segurar o lápis, mas com o tempo você vai ter que fazer o seu desenho, a sua caligrafia, e ela vai ter uma característica que é sua, que não é só copia do outro, mas alguma coisa que você coloca. E por isso esse mestre tem que ser superado. Não é interessante? Ele é aquele que te aponta o caminho para que você caminhe e se torne um mestre do caminho.
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É essencial alguém ter um professor?
Ricardo Sasaki responde
Essa é uma pergunta que precisa ser qualificada. O que se quer dizer com ter um professor? Significa se submeter a alguém, praticando estrita e obedientemente o que ele/ela ensinam? Significa visitar ocasionalmente para receber ensinamentos? É possível ter vários professores? Devem ser da mesma escola ou podem ser de escolas diferentes?
[…]
A tendência de ver a participação e mesmo progresso no Buddhismo como atrelado necessariamente a ter professores e participar formalmente de instituições afeta o desenvolvimento de todos. Os que se ligam a um centro passam a pensar que estão numa situação privilegiada e que somente estar lá garante que estão no caminho certo; professores envolvidos com essa ideia passam a imaginar que realmente representam linhagens e ensinamentos que vêm desde o Buddha e que eles mesmos são essenciais para o grupo de fieis; e aqueles que se interessam pelo Buddhismo mas que por algum motivo não se ligaram a um professor ou a um centro, se sentem ora cidadãos buddhistas de segunda categoria, ora rebeldes independentes que descobrirão por si mesmos o caminho verdadeiro, assim como o Buddha o fez.
Nisso tudo, a função essencial dos centros, templos e professores se perde, de guias e amigos mais experientes que poderiam ser, eles se transformam em guardiões de portais esotéricos, locais essenciais em que o neófito e ignorante deve necessariamente frequentar para receber a joia da transmissão que lá se esconde.
[Veja aqui o artigo com a resposta completa a esta questão]
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É essencial alguém frequentar um centro buddhista?
Ricardo Sasaki responde
Antigamente, a função de um mosteiro buddhista (que é a instituição original criada pelo Buddha) era de prover duas coisas: 1. oferecer um espaço ideal em que homens e mulheres pudessem se dedicar completamente à prática e realização dos ensinamentos; 2. preservar os ensinamentos do Buddha para as próximas gerações.
[…]
O mosteiro serve, assim, para o treinamento de pessoas que queiram se dedicar ao modo de vida monástico preconizado pelo Buddha. Centros e templos, por outro lado, servem de locais de ensinamentos, inspiração, esclarecimento, coisas importantíssimas, mas que não podem ser consideradas condições indispensáveis na vida espiritual de alguém bem intencionado. Tal pessoa ainda terá que encontrar em si mesmo o tempo, a dedicação e o esforço em discernir o joio do trigo nos ensinamentos. Apenas frequentar um centro buddhista não é garantia de esclarecimento, nem isso deveria ser usado para discriminar e separar devotos sinceros.
[Veja aqui o artigo com a resposta completa a esta questão]
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Observação:
Para complementar as respostas acima, acrescento que a importância da linhagem e de uma relação mestre-discípulo varia de escola para escola, e se estamos a falar de monásticos ou leigos. No Vajrayana (Budismo Tibetano), ter um mestre é importante, incluindo para leigos. Em várias escolas Mahayana como a Soto Zen, Rinzai, entre outras, ter um mestre também é importante para leigos. Em escolas como essas a pratica sem um mestre e um grupo torna-se deficitária, o “pacote” não fica completo, pois todo o contexto é importante para uma boa prática. Ter um mestre, alguém que dizemos “este é o meu mestre”, tem a sua importância, ainda que o discípulo possa receber também ensinamentos de outros mestres. Ter um mestre também não significa necessariamente que exista uma relação pessoal e um contacto frequente. Há outras escolas Mahayana em que os mestres também são importantes, mas não se estabelece uma relação mestre-disciplulo com os leigos.
E no Theravada os mestres também são importantes, mas a relação que se estabelece com os leigos também não tem a importância que existe em algumas outras escolas como vimos acima. Por exemplo na Tailândia, um país onde o Budismo Theravada domina, os budistas leigos normalmente não têm “um mestre”, não existe muito o conceito de o mestre X é “o meu mestre”. Os leigos vão aos templos e recebem ensinamentos de vários mestres; podem ter os seus professores preferidos ou os templos que apoiam, mas normalmente não têm alguém que possam dizer “este é o meu mestre”. A busca é mais pelo Dhamma (ensinamentos) do que pelo mestre, e isso pode ser feito de forma presencial como também através de livros, áudios e vídeos. Por vezes também existe a situação em que a pessoa se considera discípula de algum mestre, mas porque segue os ensinamentos desse mestre, não porque existe uma relação especial, e muitas vezes nem houve qualquer tipo de contacto. O contacto com os mestres e as comunidades, a prática conjuntamente com pessoas que se apoiam mutuamente, e eventualmente retiros continua a ter a sua importância, embora não seja uma condição absolutamente essencial.
Outro aspeto a levar em conta é que a essência dos ensinamentos budistas partilhados pelos professores é a mesma, mas existem certas diferenças conforme a escola e também cada professor tem a sua abordagem e forma de ensinar. Geralmente os budistas, independentemente da escola, ao longo da vida acabam por receber ensinamentos de vários mestres, seja através de um contacto mais próximo, ou através de palestras, livros, áudios, vídeos, etc.
Leitura recomendada (links externos):
- O Mestre Mandou (Folhas no Caminho)
- Monges, Sexo, Família, Dinheiro e etc. (Folhas no Caminho)
- Monges casados (Folhas no Caminho)
- Os Monges… japoneses (Folhas no Caminho)
- Quando os homens mudam o Vinaya (Folhas no Caminho)
- Cuando un maestro budista cruza la línea (Lion’s Roar)
Veja também:
- É possível seguir mais que uma tradição ou escola budista?
- Investigue a fundo
- Porque é importante apoiar os templos e as comunidades?
- Sinais que estamos perante uma legítima e boa escola budista ou uma má escola budista
- Cuidado com as seitas e cultos
- Um barco para atravessar o rio e os 5 tipos de engano
- Você é espiritual mas não religioso? 10 razões pelas quais o budismo enriquecerá o seu caminho
- Quando digo que sou Budista
- Os 3 ramos (ou veículos) do Budismo: Theravada, Mahayana e Vajrayana
– Olhar Budista > Recursos > Budismo: comece aqui! –
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