Meditação Vídeo-palestras

Meditação Vipassana e Sensação do Corpo | Eilona Ariel

“Há 26 séculos houve um cientista brilhante, o Buda. Ele fez uma investigação de seis anos e quando a terminou descobriu que cada input, cada dado que a mente recebe pelas portas sensoriais, as bases sensoriais, cada imagem, som, sabor, cheiro ou toque gera uma sensação no corpo, e nós reagimos-lhe cegamente. A mente também gera dramas, memórias, pensamentos, emoções, raiva, medo, todos eles acompanhados por uma sensação no corpo.” Eilona Ariel


Transcrição:

(Som de avião a jato)

Sentiram isto? Algo no vosso corpo? Sensações no vosso corpo? E que tal se juntarmos imagem e som?

(Som de arranhão)

A maior parte das pessoas reage tal e qual como vocês reagiram. Já se realizaram vários estudos para perceber o porquê da nossa reação ao som das unhas a arranhar um quadro preto. Um estudo concluiu que este som se assemelha aos gritos de alerta dos macacos, que geravam reflexos condicionados nos nossos ancestrais. Num estudo mais recente descobriu-se que está relacionado com a anatomia do nosso canal auditivo. O nosso canal auditivo amplifica determinadas frequências, e o som de unhas a arranhar um quadro encontra-se nessa gama de frequências, por isso esse som irrita-nos.

Mas nós não podemos alterar tudo aquilo que nos causa sensações desagradáveis. É simplesmente impossível. Deparamo-nos com imagens e sons e odores e aromas e toque todos os dias da nossa vida. Não podemos fazer tudo simplesmente desaparecer.

Há 26 séculos houve um cientista brilhante, o Buda. Ele fez uma investigação de seis anos e quando a terminou descobriu que cada input, cada dado que a mente recebe pelas portas sensoriais, as bases sensoriais, cada imagem, som, sabor, cheiro ou toque gera uma sensação no corpo, e nós reagimos-lhe cegamente.

A mente também gera dramas, memórias, pensamentos, emoções, raiva, medo, todos eles acompanhados por uma sensação no corpo.

O que é notável é que ele descobriu que, na verdade, nós reagimos às sensações em si e não ao objeto exterior. A mente recebe uma imagem, uma forma, uma configuração, e reconhece-a imediatamente: um ser humano, um homem, bem-parecido, assustador. E a reação é acompanhada por uma sensação. Se for um rapaz giro, sensações agradáveis, se for um rapaz assustador, sensações desagradáveis, e a nossa respiração também começa a acelerar. Esse cientista apercebeu-se que nós reagimos com ânsia, constantemente.

Acabaram de ver alguns exemplos que eram nojentos e intensos, e sentiram uma sensação no corpo mas, na verdade, em cada momento da vossa vida, até mesmo neste momento, o vosso subconsciente está a produzir reações.

Mudaram a vossa postura. Não estavam confortáveis. Mudaram para uma posição mais confortável porque não gostam de sensações desagradáveis, certo? Ou talvez tenham vestido calças muito justas hoje, um cinto apertado; em breve começarão a achar que a oradora é aborrecida e que gostariam mesmo de sair daqui, mas isso é porque não vestiram o vosso pijama ou roupas largas, que vos permitiriam gozar o dia de hoje.

Portanto, nós nem sequer nos damos conta que estamos a reagir a toda a hora a sensações geradas no nosso corpo.

O Buda ofereceu uma prática mental para conseguirmos ultrapassar as reações cegas.

Chama-se Vipassana.

Significa ver de forma especial, como uma compreensão profunda, como uma perceção exterior à experiência.

Eu tive a sorte de saber da existência de um curso de 10 dias no Nepal, há 26 anos. Era um retiro de silêncio em que ensinavam meditação Vipassana; eu não sabia o que era exatamente a meditação, mas mal pude acreditar quando, sentada 10 horas por dia, durante 10 dias, me apercebi que, na verdade, eu não reagia a quem me insultava. Não era à pessoa que eu reagia. Era às sensações desagradáveis que a pessoa evocava no meu corpo. Eu não sofro devido à minha tristeza, — que eu tinha — é por causa das sensações que acompanham essa emoção.

E então, no final desse curso, mal podia esperar para pegar no telefone e ligar a todos os meus conhecidos e dizer-lhes: “Tens de ir.” Na altura eu estava a viver no Nepal, liguei a toda a gente que conhecia. Alguns levaram-me a sério, e até foram, mas outros, como a minha irmã, por exemplo, diziam algo do tipo: “Eilona, pareces uma missionária!”

(Risos)

E quando ela disse isso, teve efeito, a sério, — eu deixei de falar da experiência a toda a gente — mas senti que tinha de fazer alguma coisa.

Então decidi fazer um filme. Colaborei com a Ayelet Menahemi, uma realizadora muito talentosa, que também era meditadora e queria fazer voluntariado e contribuir para que as pessoas soubessem da existência desses cursos.

E nós pensámos: “Vamos fazer uma excursão à volta do mundo.” Naquela altura havia 25 centros de meditação que ensinavam precisamente a técnica de que estamos a falar, segundo o professor S. N. Goenka, e decidimos comprar o equipamento todo, uma equipa de comandos, 150 kg de equipamento, para andar à volta do mundo e filmar em cada centro.

Mas que tipo de filme seria este? Quer dizer, as pessoas estão ali sentadas, de olhos fechados, 10 horas por dia. (Risos) O quê? Vão almoçar, bebem, sentam-se? Começámos a ficar com dúvidas quando começámos a digressão, indo de centros americanos aos franceses, aos alemães; fomos até à Ásia, e foi então que tudo fez sentido: Tínhamos pelo menos um sítio que servia para o nosso filme: a cadeia de Tihar, em Deli.

Tihar foi conhecida durante décadas pelas suas condições desumanas. Era vista como um verdadeiro inferno.

Um sítio horrível, mas essa prisão mudou com um programa de Vipassana. Decidiram transformar uma das alas num centro de Vipassana, porque queriam que a maior parte dos seus prisioneiros completassem este programa.

E porquê?

Porque eles tinham um problema de reincidências: os criminosos saíam em liberdade, voltavam a cometer crimes, e regressavam à prisão; cerca de 70% de reincidências.

O programa de Vipassana conseguiu finalmente reduzi-las, por isso era bastante desejado.

Aqui está uma amostra de como era este programa:

(Vídeo) Narrador: “O Vipassana é ensinado no quarto dia do curso. Os alunos aprendem a observar, com objetividade, todas as sensações no seu corpo, quaisquer que estas sejam, sem lhes reagir. Observam as emoções a ir e vir; observam a dor a ir e vir; observam o prazer a ir e vir. E apercebem-se, não intelectualmente, mas através da sua própria experiência, que nada é permanente. Ódio, paixão, ganância, já não são coisas abstratas. Ao observar as sensações físicas que surgem com essas emoções, e ao compreender a sua natureza impermanente, conseguimos realmente começar a mudar o hábito de reagir cegamente. Entre os dois extremos de expressão e supressão existe uma terceira opção: mera observação.”

Eilona Ariel: O filme teve sucesso, apareceu em vários canais televisivos, e depois chegou às mãos do Dr. Ron Cavanaugh, que estava a trabalhar com a Prisão de Donaldson.

(Vídeo) Ron Cavanaugh: “Quando se fala em Vipassana, fala-se de uma técnica de meditação que começa onde as terapias cognitivo-comportamentais acabam.”

Eilona Ariel: Em Donaldson, que é uma prisão de alta segurança, a maior parte dos reclusos não é libertada. A maioria está no corredor da morte, em prisão perpétua sem liberdade condicional, ou a cumprir prisão perpétua.
(Vídeo) Narrador: “Estes prisioneiros vivem num mundo social perigoso. A sobrepopulação, privação e desesperança levam estes homens à agressividade e ao desespero extremos. Neste ambiente, a autorreflexão e mudança são difíceis, se não mesmo impossíveis.

Em janeiro de 2002, a prisão foi palco de uma experiência radical. Permitiram a realização de um retiro de meditação de 10 dias, baseado em ensinamentos budistas antigos, dentro desta prisão de segurança máxima dos dias modernos.”

Homem: “O ginásio tinha sido transformado de um local em que as pessoas berravam e gritavam — tinha havido muitas lutas ali, tinha havido pessoas agredidas nessa área — e tinha sido transformado numa área em que podíamos tirar os sapatos e caminhar até um tapete onde nos sentávamos a meditar.”

Eilona Ariel: Estas pessoas são presas perpetuamente desde muito novas. Algumas delas estiveram furiosas durante anos.

A primeira vez que tiveram algum alívio foi quando lhes ensinaram a sentar-se essas 10 horas diárias, durante 10 dias, e observar as sensações a surgir com a sua raiva, que antes provocaria uma reação imediata.

Houve uma redução de 20% em ações disciplinares. E então decidiram, em Donaldson, realizar Vipassana, periodicamente, pelo menos quatro vezes por ano, para que muitos mais prisioneiros pudessem realizar o programa.

(Vídeo — The Dhamma Brothers): “Tive sempre muita raiva. Tive sempre muita raiva. Aprendi o controlo da raiva, a gestão do ‘stress’, mas o controlo da raiva ensina-me a disfarçá-la, e a gestão do ‘stress’ ensina praticamente o mesmo. Quando fiz Vipassana, fiquei sentado numa almofada durante 10 dias. Isso mostrou-me como… deixar a coisa surgir e lidar com ela. Não deixar ninguém reprimi-la. Tenho de lidar com isto. Foi isso que fiz. Toda a gente comete erros. Eu cometi um erro. E toda a gente pode mudar. Eu não posso ficar de fora da mudança. Sabe bem.”

Eilona Ariel: Se não fosse o Vipassana, eu não estaria aqui a falar para vocês, porque eu era muito tímida, tanto em criança como adulta, dolorosa e nervosamente tímida, de tal modo que nunca falava em frente a outras pessoas. Costumava ficar doente e com febre alta sempre que tinha de ir à escola e enfrentar os alunos — meus amigos. Simplesmente não conseguia.

Não quer dizer que já não seja stressante, porque é, mas consigo lidar com isso.

(Risos)

Queria apenas que soubessem acerca desta oportunidade de mudança interior.

Obrigada!

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