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Uma nuvem nunca morre, ela se transforma em chá e em muitas outras coisas

Num discurso para crianças, Thich Nhat Hanh, utilizando uma didática simples, poética e de fácil compreensão, ensina alguns conceitos budistas como a vacuidade e interdependência, mas sem recorrer a qualquer um desses termos “técnicos”.

O texto que se segue é a transcrição do discurso de Thich Nhat Hanh.

Hoje nós vamos meditar sobre uma chávena de chá. Nesta manhã, se vocês foram connosco andar em meditação, vocês viram-me tomando o meu chá em paz e feliz.

Tomar chá também é uma meditação. Quando vocês olham para o chá, o que vocês veem? Eu vejo uma nuvem. Eu vejo uma nuvem no chá. Ontem, o chá era uma nuvem lá em cima no céu, mas hoje, ela se tornou o chá na minha chávena. E quando vocês olharem para o céu azul e não encontrarem mais a vossa nuvem, vocês podem dizer: “Oh! a minha nuvem morreu!” Mas na realidade ela não morreu. Ela se tornou o chá que está na minha mão.

Então, quando eu olho com atenção plena para o chá, eu vejo a nuvem no meu chá e eu digo: “Olá minha nuvem! Eu te vejo!” E quando eu tomo o meu chá, eu bebo a minha nuvem. E vocês sabe que são feitos de nuvem, pelo menos 70% de vocês é feito de nuvem. Se vocês tirarem a nuvem de vocês, não sobrará nenhum “você”. Então a nuvem é um ótimo tópico de meditação.

A nuvem passa um bom tempo viajando, e quanto ela finalmente se torna chuva, ela não morre, ela se transforma. A nuvem se torna chuva. Uma nuvem nunca morre. A nuvem pode se tornar neve, ou chuva, ou gelo, mas uma nuvem nunca morre. Então, a nuvem se transforma na chuva, a chuva se torna o riacho na montanha, e esse riacho flui e se transforma num rio, e o rio vai para o mar e o calor gerado pelo sol ajuda a água do oceano a se evaporar e a se tornar nuvem de novo. Então, a nuvem passa um bom tempo viajando e utilizando todo o tipo de formas, utilizando todo o tipo aparências.

Vocês sabem, isto, esta nuvem na minha chávena de chá, e eu vou tomar este chá. E o que ele se tornará? Este chá se transformará no meu discurso para vocês. “Minha queria nuvem eu estou te tomando. Bem, você se tornará uma comigo, e graças a você, eu vou fazer este discurso a essas crianças.”

Porque eu sei como tomar o meu chá com atenção plena. Por isso eu posso ver a nuvem no meu chá e eu posso ver que essa nuvem é muito útil para me ajudar a fazer este discurso. Sem a nuvem, nenhum discurso é possível. Lembrem-se que vocês também são feitos de nuvem, pelo menos 70% de vocês são nuvem. Então, sorriam para a nuvem no vosso chá, sorriam para a nuvem no vosso corpo. E da próxima vez que vocês estiverem comendo um gelado, olhem para o gelado e vocês verão também a nuvem no vosso gelado. Eu acho que vocês conseguem, em 2, 3 segundos, olhando para o gelado, vocês verão a vossa nuvem no vosso gelado. Antes de vocês comerem o vosso gelado, sorria para nuvem no vosso gelado primeiro. Isso é meditação. É muito fácil, é muito agradável de fazer.

Eu vou mostrar outra coisa para vocês. Eu faço caligrafia, eu desenho círculos. E sabem de uma coisa? Há aqui também uma nuvem. Tem uma nuvem aqui dentro. Vocês precisam de algum tempo para olhar. Isto é uma pedaço de papel, tinta e um carimbo, mas se vocês olharem profundamente, vocês saberão que existe uma nuvem aqui. E há chá aqui também. Eu vou explicar como.

Fazer caligrafia para mim é uma prática de meditação. E cada sessão de caligrafia começa com chá. Eu nunca fiz caligrafia sem antes tomar uma chávena de chá. Eu preciso do chá para me ajudar a ficar acordado, para fazer a minha caligrafia bem feita.

Vocês sabem que o chá e a meditação estiveram juntos por muitos milhares de anos? Os monges chineses, os monges vietnamitas que praticam meditação sentada, descobriram as folhas de chá e descobriram que se vocês beberem chá, vocês ficarão acordados. Vocês não irão dormir durante a meditação sentada. Então o Zen e o chá estiveram juntos por muitos muitos anos. E é por isso que como um praticante de meditação, eu sempre tenho o chá como meu companheiro. E é por isso que antes de fazer caligrafia eu tomo o meu chá.

E vocês sabiam que eu sempre misturo chá na minha tinta, na minha tinta chinesa? Então quando vocês olham profundamente a tinta vocês verão o chá dentro. Essa é a verdade. Eu sempre misturo chá com a tinta, mas se vocês olharem ainda mais profundamente, vocês verão algo mais.

Enquanto faço caligrafia, eu pratico respiração consciente. Eu seguro o pincel e eu inspiro um segundo, dois segundos, três segundos e durante esse tempo de inspiração eu faço mais ou menos um terço do círculo. Então, inspiração é um terço do círculo. Prática de atenção plena de caligrafia. E quando eu expiro, eu termino e faço o resto do círculo. Isso demora mais ou menos 5 segundos para terminar. 3 segundos para inspirar, 3 segundos para expirar com atenção plena e eu termino o círculo. E é por isso que quando vocês olham para este desenho, vocês não podem ver apenas uma nuvem, vocês não podem ver apenas o chá, mas você podem ver a minha inspiração dentro do desenho.

Eu trouxe o material e vou mostrar algumas caligrafias hoje. Primeiro, algo que vocês já sabem: “uma nuvem nunca morre”. A natureza da nuvem é a natureza do não-nascimento e não-morte. Olhando superficialmente vocês podem achar que a nuvem pode nascer e pode morrer, mas olhando profundamente vocês descobrem que uma nuvem nunca pode morrer. A natureza da nuvem é a natureza do não-nascimento e não-morte. E neste retiro nós vamos meditar sobre isto, amanhã e depois de amanhã, sobre a nossa verdadeira natureza do não-nascimento e não-morte. Uma nuvem, lembram-se? Pode virar neve ou chuva, ou gelo mas uma nuvem nunca pode morrer. Lembrem-se!

E este vocês já sabem: “sorria para a nuvem no seu chá”. É muito bom. Se vocês têm esta caligrafia na vossa sala de chá, ela vai vos lembrar de praticarem a respiração e a aproveitarem mais o vosso chá. Aliás, há também uma nuvem no vosso café.

E querem saber algo mais? Quando vocês choram… há um nuvem nas vossas lágrimas, e talvez o chá que vocês beberam ontem, eram parte das vossas lágrimas. E é por isso que eu escrevi: “As lágrimas que derramei ontem se tornaram chuva”. E a chuva vai-se tornar chá e este chá vai-se tornar lágrimas de novo.

Se vocês não praticarem, vocês não saberão lidar com o vosso sofrimento e vocês continuarão a chorar muito e haverá muitas lágrimas.

As lágrimas que eu derramei ontem se tornarão chuva.

Amanhã nós teremos outro discurso para crianças. Agora quando vocês ouvirem o sino, levantem-se, cumprimente todos, saiam e continuem e vossa prática.

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