Por vezes surge alguém que diz que o” Buda não era budista”, “Jesus não era Cristão”, “Maomé não era Muçulmano”, etc. Alguns poucos mestres budistas também já afirmaram que o ” Buda não era budista”, outros não corroboram com essa afirmação.
A grande maioria dessas afirmações vêm principalmente de pessoas influenciadas pelo movimento New Age e surgem como uma crítica a filiarmo-nos a uma escola budista ou a termos algum mestre. É uma crítica às instituições e comunidades, é a excessiva glorificação do individualismo.
O Ocidente passou por um período conturbado, onde existia um grande controlo por parte das instituições religiosas e uma castração do pensamento e liberdade. Nós conquistamos essa liberdade, mas ficaram marcas. Além disso, a ciência também trouxe um enorme benefício para a humanidade, tornando menos relevante algumas instituições religiosas.
Por tudo isso, atualmente qualquer “ismo” causa uma certa “comichão” nas pessoas, passa-se então a desvalorizar qualquer tipo de filiação religiosa, como se automaticamente fossemos capturados por um sistema.
De referir que no budismo se atribui muita importância ao livre pensamento, sendo a fé cega um problema.
Mas será que o Buda não era budista?
O Buda histórico afirmou que antes dele existiram outros Budas e que ele ensinava o que todos os Budas ensinavam. O Buda criou uma comunidade, um sistema de treinamento, um modo de vida. Em Páli era chamado de Buddha-Sasana (a Doutrina de Buda), ou Buddha-Dhamma (a Verdade ensinada pelo Buda). Uma possível tradução simplificada… Budismo! Acrescenta-se ainda que o Buda se referia a si como “um membro do sangha (comunidade)” e em várias ocasiões expressa respeito e enaltece as Três Jóias (os Budas, o Dharma e o Sangha). Ou seja, era tão “budista” quanto qualquer outro monge, monja, leigo ou leiga.
Segundo o Monge Genshô:
“Podemos responder esta questão de duas formas:
1) Buda ensinou um caminho além dos extremos, sem comprometer-se com as palavras nem afirmar um conhecimento absoluto sobre todas as coisas, para várias questões alegou desimportância em considera-las. Não disse que revelava ou era um mensageiro de uma divindade ou que tinha em mente uma organização perfeita para difundir seu ensinamento. Alegou ser um ser de sonho ensinando para seres oníricos e enfatizou continuamente a relatividade das palavras, colocando em dúvida a capacidade destas de transmitir uma experiência não transmissível.
2) O mesmo Shakyamuni Buda, estabeleceu um corpo minucioso de regras para a comunidade dos monges e sua relação com os leigos. Ordenou os monges através de rituais colocando neles vestes especiais, o manto budista. Ensinava tendo em mente hierarquia entre a assembléia, colocando os mais antigos em uma posição e os mais novos em outra. Estabeleceu portanto rituais e um corpo canônico de regras de comportamento. Estruturou um processo de ensino em passos cuidadosamente graduados. Deu autoridade a discípulos mais destacados e reconheceu a realização espiritual dos que a atingiam. Criou portanto uma instituição muito bem estruturada, cujo arcabouço permanece sendo usado mais de dois milênios mais tarde por diferentes escolas budistas, as quais o vem adaptando a diferentes países e culturas.
Assim podemos concluir, somando ambas as afirmações, que, do ponto de vista doutrinário, Buda ensinou muito além de meras organizações mundanas. Porem para atingir seus objetivos estabeleceu sim uma organização religiosa e foi seu líder durante décadas. Desta forma Buda ensinou algo muito elevado mas simultaneamente, foi, sem dúvida alguma, o primeiro e o maior dos líderes budistas, o fundador original de um sistema de transmissão de seu ensinamento.” – Pico da Montanha
Outro aspecto que está conectado com a “glorificação do caminho individual”, é que muitas vezes é dito que o Buda despertou sem que tenha precisado de alguém. Mas na verdade o Buda teve dois mestres que são referidos nas escrituras: Alara Kalama e Uddaka Ramaputta. É certo que o Buda a determinado momento deixou esses mestres pois já não conseguia evoluir mais e foi sozinho que conseguiu despertar. Mas, esses mestres foram importantes para que o Buda tivesse chegado até certo ponto do caminho.
De referir que estar inserido ou não numa comunidade é uma decisão de cada um, se alguém quer percorrer o caminho sozinho ou se essa é a única solução devido às suas circunstâncias atuais, tudo bem, apesar da conexão com um professor qualificado ter a sua importância. Porém, é um erro e de certa forma uma falta de humildade desvalorizar o papel dos mestres, comunidades e instituições, pois se hoje podemos seguir o caminho budista, é porque os mestres, comunidades e instituições o preservaram, transmitiram e continuam a transmitir.
Leitura adicional sugerida (link externo):
Veja também:
- O que é o Budismo? Quem foi o Buda?
- O que o Buda descobriu e qual a sua obra?
- As 3 Jóias: Buda, Dharma e Sangha
- Qual a importância de se ter um mestre ou professor? É essencial frequentar um centro ou um templo?
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