“Não existe como alimentar essa fantasia de neutralidade, essa fantasia de que nós nada temos haver com a realidade social.” – Monge Joaquim Monteiro
O texto que se segue é a transcrição de um trecho (a partir do minuto 43) da Aula 01 do curso “História do Budismo Indiano”, ministrada pelo Monge Joaquim Monteiro no CEBB João Pessoa.
“Aquela fantasia que muitas pessoas alimentam: o budismo transcende a sociedade, o budismo está fora da sociedade, não tem nada haver com a sociedade, não se posiciona, não tem nada haver com isso; eu acho isso até engraçado – para quem como eu viveu 18 anos no Japão, que é um país que tem instituições budistas e ainda hoje são extremamente fortes, que para o bem ou para o mal têm um vinculo fortíssimo com a ética social, com a política, com a sociedade – isso é um brincadeira, uma brincadeirinha, uma piada, não dá para levar a sério!
Os dois anos que eu passei em Taiwan: Taiwan tem uma característica muito curiosa, que embora o budismo exista em Taiwan desde o século 17, desde que vieram as primeiras imigrações chinesas para a ilha, o budismo só começou a ter uma força maior, precisamente a partir do ano que o taiwaneses fizeram o que eles tinha que fazer. Em 1987, eu me lembro que eu estava no Japão, eu via na televisão e torcia e pulava de alegria. Foi o ano em que os taiwaneses derrubaram a ditadura e transformara Taiwan no país mais democrático, mais aberto de toda a Ásia. E foi a partir daí que o budismo tem uma Juventude em Taiwan, porque em toda a Ásia talvez seja o único lugar em que ele está se expandindo novamente, que ele está adquirindo uma forma nova.
A presença do budismo na sociedade, as discussões sobre a ética budista, a prática social budista, a assistência social budista, são extremamente intensas em Taiwan. Então essa história de que o budismo não tem nada que ver com a sociedade, que os budistas não precisam pensar a sociedade, isso é fantasia ocidental, e uma fantasia ocidental extremamente prejudicial, extremamente perigosa.
Eu não estou querendo dizer com isso, que os budistas têm que ter uma única postura politica ou ideológica. Eu acredito que o pensamento budista dá margem para diversos tipos de posicionamento, de posicionamentos bastante diferenciados. Eu também não estou querendo dizer que os budistas enquanto budistas ou enquanto comunidade budista tenham por exemplo que estar ligados a um determinado partido, a uma determinada corrente partidária. Eu não tenho a menor pretensão de propor uma loucura dessas. O que eu tenho a dizer é o seguinte: não existe como alimentar essa fantasia de neutralidade, essa fantasia de que nós nada temos haver com a realidade social.
Nós não precisamos de agir como os partidos políticos agem, como a média de como os movimentos sociais agem. Mas é importante sim, ter uma discussão sobre a realidade social, pensar nas implicações do budismo para sociedade. E por exemplo, quando o Lama Samten vai dialogar com a comunidade do castelinho, ninguém diz que ele é de tal ou qual partido político, que ele está assumindo tal ou qual ideologia, mas ele está agindo de uma forma eficaz concreta. Então nos precisamos pensar: que tipo de postura social, que tipo de atividade social a Sangha budista precisa ter enquanto Sangha. E essa é a grande questão que eu pessoalmente acho que pode inclusive decidir o futuro que o budismo vai ter no país.”
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