No passado assim como hoje, o discurso do personagem interpretado por Charles Chaplin no filme “O Grande Ditadora”, continua a ter a sua pertinência.
Atualmente no mundo existem vários conflitos sangrentos assim como vários povos submetidos à tirania. A guerra na Ucrânia tem sido o mais mediático e o que tem tipo maiores repercussões a nível internacional. Inúmeras atrocidades têm sido cometidas dando origem a milhares de mortos e milhões de deslocados. Mas além do conflito na Europa existem grandes conflitos na Etiópia, lémen, Myanmar, Haiti, Síria, Afeganistão e com Militantes islâmicos na África. Em todos eles o sofrimento resultante é incalculável. O que está na origem desses conflitos são motivos variados, um dos múltiplos fatores no núcleo de alguns deles é a liderança tirânica. Recordemos por isso o filme de Charles Chaplin ou Charlin Chaplin, o seu contexto e o último discurso.
“O Grande Ditador” é uma sátira burlesca de Charles Chaplin a Hitler, ao nazismo e ao fascismo. O filme estreou em 1940 em plena II Guerra Mundial. Chaplin escreveu, realizou o filme e interpretou as duas principais personagens, o ditador Adenoid Hynkel e um barbeiro judeu. É uma das suas obras memoráveis e é o seu primeiro filme falado (os anteriores eram mudos).
O discurso final é o momento mais alto do filme. O protagonista fala do absurdo da tirania, se opõe à opressão e defende a liberdade e a população. Ele desafia homens, mulheres, soldados e crianças a não se odiarem e a se amarem; ele também desafia os soldados a lutarem pela paz e pela sua liberdade e a não se deixarem serem comandados por déspotas. No seu discurso podemos identificar várias vezes o que no budismo se chama de os 3 venenos mentais: raiva, ganância e ignorância; assim como diversas referências à compaixão.
O discurso
Transcrição:
Sinto muito, mas eu não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar – se possível – judeus, o gentio… negros… brancos.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo – não para o seu infortúnio. Porque havemos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.
O estilo de vida poderia ser livre e da beleza, porém nós nos perdemos no caminho. A ganância envenenou a alma dos homens… levantou no mundo as muralhas do ódio… e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado na penúria.
O nosso conhecimento nos fez cínicos; a nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos muito pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.
A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A própria natureza dessas coisas é um apelo eloquente à bondade do homem… um apelo à fraternidade universal… à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhares de pessoas pelo mundo afora… milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas… vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo:
Não desespereis! A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia… da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá.
Soldados! Não vos entregueis a esses brutais… que vos desprezam… que vos escravizam… que arregimentam as vossas vidas… que ditam os vossos atos, as vossas ideias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar… os que não se fazem amar e os inumanos!
Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas está escrito que o Reino de Deus está dentro do homem – não de um só homem ou grupo de homens, mas em todos so homens! Está em vós! Vós, o povo, tendes o poder – o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela… de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto – em nome da democracia – usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo… um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.
É pela promessa de tais coisas que cruéis têm subido ao poder. Mas eles mentem! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, sumir com as barreiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à intolerância. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à felicidade de todos nós. Soldados, em nome da democracia, vamos todos nos unir!
Hannah, estás me ouvindo? Onde te encontrares, levanta os olhos! Vês, Hannah? O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam! Estamos saindo da treva para a luz! Vamos entrando num mundo novo – um mundo melhor, em que os homens estarão acima da cobiça, do ódio e da brutalidade. Ergue os olhos, Hannah! A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar. Voa para o arco-íris, para a luz da esperança. Ergue os olhos, Hannah! Ergue os olhos!
Veja também:
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