Trechos Vajrayana (Tibetano)

Os chakras no budismo tibetano

O conceito dos chakras não está ausente no budismo, nomeadamente no budismo tibetano, onde até desempenha um papel importante. No budismo tibetano geralmente são ensinados 4 chackras, mas dependendo da tradição meditativa eles podem variar entre 3 e 6. Numa classificação de 5 chakras seriam os seguintes:

  • Chakra da Base (associado ao elemento Terra e ao mantra LAM)
  • Chakra Abdominal (associado ao elemento Água e ao mantra VAM)
  • Chakra do Coração (associado ao elemento Fogo e ao mantra RAM)
  • Chakra da Garganta (associado ao elemento Ar e ao mantra YAM)
  • Chakra da Cabeça ou Coroa (associado ao elemento Espaço e ao mantra KHAM)

Para conhecer melhor o conceito dos chakras, segue tradução de um trecho do livro “Yantra Yoga: The Tibetan Yoga of Movement”, de Chogyal Namkhai Norbu.

Canais e cakras [o mesmo que chakras mas na língua Pali] representam a estrutura interna do corpo humano, referida nos ensinamentos tântricos como “corpo vajra”. “Vajra” significa “indestrutível” e “corpo vajra” refere-se à dimensão dos três componentes fundamentais: os canais e os cakras, o prana que flui através deles e o bindu ou thigle, as sementes-essências brancas e vermelhas do corpo físico que formam a base das práticas como o Tummo.

Nos tantras Dzogchen da secção Upadesa, é explicado que, após a concepção de um ser humano, a primeira coisa a se desenvolver é o cakra do umbigo. A partir daí, através de um canal, o cakra da cabeça se desenvolve seguido pelos outros cakras principais da garganta e do coração. Esse canal ou meridiano, conhecido como canal da vida, se desenvolve na medula espinhal e na coluna. Ao mesmo tempo, permanece como a energia fundamental do canal central.

O canal central, conhecido como Uma no tibetano, está conectado aos dois canais laterais chamados Roma e Kyangma. O canal de Roma, que é branco e corresponde à energia lunar, está do lado direito nos homens e do lado esquerdo nas mulheres. Ro significa “gosto”, e a principal função deste canal é dar a sensação de prazer. O canal Kyangma, vermelho e correspondente à energia solar, está do lado esquerdo nos homens e do lado direito nas mulheres. Kyang significa “único” e, diferentemente da Roma, este canal não está conectado a muitos canais secundários. O controlo desse canal é fundamental para cultivar a experiência da vacuidade. Essas são as características dos dois canais, que estão relacionadas aos dois princípios de upaya ou método, e de prajña ou energia. Método denota tudo referente à dimensão visível ou material; enquanto prajña, que geralmente significa sabedoria discriminadora, neste contexto denota a energia da vacuidade que é a base de qualquer manifestação.

Por exemplo, se falamos da transformação como o princípio fundamental da prática do Tantra, não queremos dizer apenas a transformação da energia. Estamos acostumados à visão concreta e material e, consequentemente, precisamos como meio de transformação a figura visível de uma divindade ou mandala com cor e forma específicas. Todos esses elementos, que servem para dar uma ideia da transformação, são chamados de “método”. Prajña, por outro lado, não tem forma, mas deve ser entendida através do método. Na representação de uma divindade em união ou yab-yum, a figura masculina que representa o método é estável, enquanto a fêmea, que representa a energia, está abraçando-o em movimento dinâmico. Isso simboliza a nossa natureza: o método é estável e visível, enquanto a energia não. O que é apresentado deve ser visível e a sua representação deve permitir compreender que a sua verdadeira essência é a energia. Este princípio também está subjacente à classificação dos tantras modernos. Aqueles que usam mais o aspecto do método são chamados tantras “pai”, enquanto que aqueles que usam mais o aspecto de prajña ou energia são chamados de tantras “mãe”. De qualquer forma, os canais não são materiais, mas representam o movimento da energia, e a energia pode circular de diferentes maneiras, de acordo com a visualização dos canais. No geral, os canais são visualizados entrelaçados ao nível de cada cakra e unidos ao canal central quatro dedos abaixo do umbigo. Essa visualização é aplicada principalmente em práticas destinadas a desenvolver a sensação de prazer. Por outro lado, em alguns casos, os canais são visualizados como verticalmente paralelos. Além disso, às vezes o canal central termina quatro dedos abaixo do umbigo, onde se junta aos dois canais laterais, enquanto outras vezes termina na parte inferior do tronco.

Ilustração tibetana dos chakras e canais de energia. | Créditos – Autor: dockedship. Fonte: Wikipédia e Flickr. Licença: CC BY 2.0

Os cakras são discos ao longo do canal central onde a energia se concentra. Quatro, cinco ou seis cakras são visualizados, de acordo com o método que está sendo usado. Quando visualizamos quatro cakras, eles estão na cabeça, garganta, coração e umbigo. Quando visualizamos seis cakras, como quando trabalhamos com a sensação de prazer, adicionamos o cakra encontrado quatro dedos abaixo do umbigo e o cakra na base do tronco. Nas práticas de transformação tântrica, é necessário também visualizar as pétalas ou ramos específicos de cada cakra, geralmente com oito no coração, dezasseis na garganta, trinta e dois na cabeça e sessenta e quatro no umbigo. No entanto, também existem outros pontos de vista a esse respeito. Os cakras não são algo imaginário, mas são pontos onde a energia surge e se concentra. Assim, embora não se possa dizer que os canais e os cakras existem no nível físico, eles têm a sua própria realidade; caso contrário, não haveria explicação da eficácia de terapias médicas como acupuntura e moxabustão. A questão é que eles não têm uma estrutura material rígida. Às vezes, os textos dizem que o canal central deve ser visualizado com uma polegada de espessura, às vezes da espessura de uma flecha e, outras vezes, muito mais delgado. Se tivessem um tamanho definitivo, sempre seria visualizado da mesma maneira. Similarmente, os cakras são visualizados de acordo com instruções específicas, e não com base no número real. As visualizações são sempre feitas em pontos específicos, porque prana ou energia vital se concentra onde concentramos a nossa mente. Nos diversos cakras, nos concentramos em esferas coloridas que representam a energia dos cinco elementos. Às vezes, as formas e cores são visualizadas em diferentes cakras, outras vezes apenas no cakra principal do umbigo.

Meditação ou contemplação significa o conhecimento da natureza da mente além do dualismo. Essa condição é simbolizada pelo canal central, enquanto os canais direito e esquerdo representam o dualismo e a respiração kármica. Vivemos sempre no tempo condicionado pela visão dualista, julgamentos, pensamentos e conceitos. Como o canal central simboliza a natureza da mente, o objetivo definitivo do Yantra Yoga é capturar o prana kármico dentro do canal central. O que isto significa? Respirar de maneira distraída através dos canais solar e lunar é a maneira como transmigramos. Através da distração, todas as ações surgem e o karma é produzido. É por isso que a respiração normal é chamada kármica. Quando um ser vivo nasce, ele já tem o seu próprio carácter produzido por um karma específico ligado ao prana e à respiração. Se queremos nos tornar donos de nós mesmos e das nossas mentes sem mais distrações, antes de tudo devemos ser capazes de controlar a respiração kármica. O principal método para fazer isso é chamado de “capturando o prana kármico no canal central” através da prática de kumbhaka, que consiste em inalar o ar através dos dois canais e forçar a energia do prana para o canal central. Dessa forma, o ar que flui nos dois canais kármicos é exaurido e integrado ao canal central.

Os cinco tipos de práticas de prana explicados neste livro servem para permitir que se realize e estabilize o conhecimento da natureza da mente, trazendo a respiração kármica para o canal central. Um praticante que permanece continuamente no estado de contemplação não tem mais problemas de energia desequilibrada. Muitas pessoas desconhecem o motivo pelo qual essa coordenação é necessária porque acreditam que a respiração é algo natural. Elas dizem: “Porque coordenar a respiração quando respiramos naturalmente desde que éramos crianças?” No entanto, na realidade, não há respiração que possa ser chamada de natural. A nossa respiração comum ligada à energia do prana é tradicionalmente comparada a um cavalo cego, enquanto se diz que a mente é como um cavaleiro coxo. Assim como um cavalo cego não pode ser independente, mas precisa de alguém para liderá-lo, a energia precisa de ser guiada pela mente. Não existe uma respiração independente e não relacionada à mente e às emoções.

Concluindo, o controlo de prana é muito importante para a abordagem do conhecimento da natureza da mente, a nossa real potencialidade. Se conseguirmos aceder a essa potencialidade e dominá-la, estamos no caminho e a realização é possível. Por outro lado, se somos ignorantes dessa condição, permanecemos escravos da nossa mente e não podemos permanecer na nossa verdadeira natureza. Assim, é importante coordenar corpo e energia, e é por essa razão que Vairocana transmitiu o ensinamento do Yantra Yoga em relação ao princípio característico de Dzogchen.

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