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A arte de esculpir a impermanência no nevoeiro (+ haikus e outros poemas)

Inspirada pela impermanência, uma das três marcas da existência referidas no budismo, a artista japonesa Fujiko Nakaya cria esculturas de nevoeiro, que se enroscam, ondulam e se dissipam nas mãos da natureza.

Misterioso, o nevoeiro inspirou escritores e artistas durante séculos, mas Fujiko Nakaya descobriu como criar esculturas a partir dele. A neblina criada artificialmente já esteve presente em diferentes espaços urbanos, museus, jardins e até fontes e praças.

Fujiko nasceu em 1933 na cidade de Sapporo, Japão. A sua obra tem raízes da obra do seu pai Ukichiro Nakaya, o físico que criou os primeiros flocos de neve artificiais.

Fujiko começou a sua carreira como pintora, estudando no Japão, nos Estados Unidos e na Europa antes de voltar para sua terra natal em 1960. Juntou-se a um grupo chamado de EAT – Experiments in Art and Technology, e passou de pintar nuvens para produzi-las. Nakaya disse ao WBUR que estava enfrentando a ideia de que as esculturas são formas predominantemente permanentes, feitas de pedra, como as estátuas da Grécia antiga e da Itália.

“É o conceito ocidental de sólido e eterno”, disse a artista, “mas no pensamento budista é sempre a natureza que responde a você de acordo com as suas regras.” E acrescentou que a natureza vence sempre.

Então, em vez de pintar nuvens, ela começou a esculpi-las. Fujiko Nakaya tem atualmente 85 anos e tem feito esculturas de neblina desde 1969.

É uma experiência multissensorial feita de gotículas de água, que muda de forma, nunca é a mesma coisa duas vezes.

“No processo, realmente cheguei à conclusão de que a natureza realmente quer se equilibrar – até mesmo o vento”, afirmou a artista.

“Eu simplesmente adoro que esteja viva. Não é uma coisa única.” disse a curadora de arte Jen Mergel ao WBUR. “É água pura e potável”, explica Mergel. “Qualquer um pode entrar nela, respirar, sentir o gosto, tocar, cheirar – assim como o nevoeiro natural – e será à temperatura ambiente”.

“Ela trabalhou com todos os tipos de artistas internacionais”, disse Mergel, mas reconhece que muitas pessoas não conhecem o nome da artista. “Ela merece ser conhecida, assim como James Turrell ou Robert Smithson e essas outras figuras que fazem arte com a luz, espaço e natureza há décadas”, continua a curadora. “Ela também tem andado a fazer algo que tem sido consistente, tem sido intemporal e agora é oportuno em termos de arte sensível ao clima.”

Nakaya espera que as pessoas pensem no relacionamento que temos com as mudanças climáticas. “Todo dia é um boletim meteorológico recorde”, diz ela. “Isso é louco. Estamos afetando o clima.” Mas a artista também espera que o seu nevoeiro desencadeie memórias. Ela diz que as suas instalações têm um jeito de fazer isso para as pessoas que as encontram.

A curador disse ao WBUR que foi fascinante ver a artista ouvir e sentir o ambiente da maneira que a maioria de nós normalmente não faz.

Fujiko Nakaya criou mais de 80 instalações em 16 países.

A neblina em haikus e poemas

Nos céus, neblina –
Corcovado envolto
em mistérios…
– Tam Huyen Van (Monge Kōmyō)

Já é primavera:
Uma colina sem nome
Sob a névoa da manhã.
– Matsuo Basho

Por toda parte que olhes
Eis que as montanhas se acham cobertas
De nevoeiro e cerejeiras floridas.
– Ryokan Taigu

Lua brilhante – Eu caminho pelos campos de arroz
próximos à minha cabaninha;
Na distância, montanhas vestidas de nevoeiro.
– Ryokan Taigu

Chuva leve — a floresta da montanha está envolta em neblina.
Lentamente a neblina muda para nuvens e geada.
Pela margem sem fim do rio, muitos corvos.
Eu me encaminho para uma colina que dá para um vale para sentar em zazen.
– Ryokan Taigu

As pessoas perguntam o caminho para a Montanha Fria
Mas estradas não chegam à Montanha Fria
No verão o gelo não derrete
E a neblina matinal é densa demais
Como alguém como eu chegou
Nossas mentes não são o mesmo
Se fosse o mesmo
Você estaria aqui.
– Han Shan

Hoje sentei diante dos penhascos
Sentei até que a neblina fosse embora
Uma só torrente de cristal
Um só cume de jade
A sombra de uma nuvem da madrugada não ainda se movendo
luz da lua à noite ainda à deriva
Um corpo livre do pó
Uma mente sem preocupações.
– Han Shan

Queria tanto ter visitado o penhasco do leste
Há já vários anos
Finalmente agarrei um cipó e subi
Mas a meio caminho chegaram nevoeiro e vento
A trilha estava estreita demais para roupas
O musgo escorregadio demais para sapatos
Detive-me debaixo desta árvore de canela
E dormi com uma nuvem como travesseiro.
– Han Shan

Vassourinha branca com cabo de sândalo
Um perfume que dura o dia todo
Macio como o nevoeiro que dobra
Revoante como as nuvens que vagam
Ajuda durante os ritos do verão Levantado limpa o pó
E com freqüência dentro do quarto de dois metros
É usado para ajudar às pessoas.
– Han Shan

Eu sento em cima de uma pedra
A torrente está gelada
Alegrias calmas têm charmes especiais
Penhascos nus no nevoeiro encantam
Este é um lugar de tanto descanso
O sol se põe e as sombras das árvores crescem
Eu observo o chão de minha mente
E um lótus nasce da lama.
– Han Shan

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